sexta-feira, 27 de julho de 2012

Pingos de Kardec - O Que é o Espiritismo



TERCEIRO DIÁLOGO
O SACERDOTE 
Objeções em nome da religião
O sacerdote. — Permita, senhor, que por minha vez lhe dirija algumas perguntas.
Allan Kardec. — Com muito prazer. Antes de as responder, entretanto, creio útil apresentar-lhe o terreno em que espero me colocar para lhe dar resposta.
Devo manifestar-lhe que não pretendo absolutamente convertê-lo às nossas ideias. Se por acaso as desejar conhecer, poderá encontrá-las nos livros em que estão expostas, onde será fácil estudá-las detidamente. Depois terá a liberdade de as repudiar ou as aceitar.
O Espiritismo tem como finalidade combater a incredulidade e suas funestas consequências, provando incontestavelmente a existência da alma e a realidade da vida futura. Destina-se, pois, aos que não crêem em nada ou que duvidam. Como sabe, o número destes não é pequeno. Os que têm fé religiosa e aqueles a quem esta fé satisfaz, dele não precisam.
Ao que diz: "Creio na autoridade da Igreja, atenho-me ao que ela ensina e sinto-me satisfeito", o Espiritismo responde que não cuida de impor-se a ninguém e que não veio para forçar convicções.
A liberdade de consciência é uma consequência da liberdade de pensamento. Este é um atributo do homem. O Espiritismo estaria em contradição com seus princípios de caridade e de tolerância se não os respeitasse. Prescreve que toda crença, quando sincera e não induz a ocasionar prejuízos ao próximo, mesmo errônea, é digna de respeito.
Se uma pessoa teima em acreditar, por exemplo, que é o Sol que gira e não a Terra, dir-lhe-emos: "Creia se lhe agrada, de vez que isso não opõe obstáculos aos movimentos da Terra. Mas note que, assim como não procuramos violentar-lhe a consciência, não deve você tentar violentar a consciência alheia. Cada vez que se transforma uma crença, intimamente inofensiva, em elemento de perseguição, torna-se ela nociva e deve ser combatida".
Tal é, senhor padre, a linha de conduta que tenho observado para com os ministros dos diferentes cultos, que me procuram. Quando me inquirem sobre pontos da Doutrina, dou-lhes as explicações necessárias; abstendo-me, não obstante, de discutir certos dogmas, do que não se deve ocupar o Espiritismo, já que cada um é livre de os julgar. Nunca os procurei, porém, com o intuito de lhes destruir a fé pela coação.
Aquele que nos vem como irmão, como irmão o recebemos. O que nos despreza, em paz o deixamos. Este é o conselho que não cesso de dar aos espíritas. Nunca incentivei os que a si atribuem a missão de converter o clero. Digo-lhes sempre: "Semeiem no campo dos incrédulos, que nele há messes abundantes a colher".
O Espiritismo não se impõe porque, como disse, respeita a liberdade de consciência. Compreende muito bem, por outro lado, que toda fé imposta é superficial e só oferece aparências da fé; nunca é a fé sincera. Expõe seus princípios aos olhos de toda a gente, de modo que possa cada um formar opinião com conhecimento de causa.
Os que aceitam, leigos ou sacerdotes, fazem-no livremente, porque os julgam racionais. De nenhuma maneira, porém, abrigamos rancor contra os que não são do nosso parecer. (...)”

FONTE: KARDEC, Allan. O Que é o Espiritismo. Editora FEB. p. 136-138.